quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Sem pensar, eu atirei, diz o assassino de Eloá

Cadu Proieti, Elaine Granconato e Rafael Ribeiro

Após três anos e quatro meses de espera, Lindemberg Alves Fernandes cumpriu o prometido por sua defesa e ontem, no terceiro dia de seu julgamento no Fórum de Santo André, falou pela primeira vez sua versão para o homicídio de Eloá Pimentel, em outubro de 2008. A morte da ex-namorada foi o único momento em que ele mostrou alguma reação durante a fala. "Sem pensar, eu atirei", confessou, após pequena pausa.
"Após a explosão da porta, a Eloá fez movimento de se levantar do sofá e, infelizmente, atirei. Foi tudo muito rápido, uma reação por pensar que ela ia tentar tirar a arma da minha mão."
Lindemberg falou por cerca de cinco horas. Deu sua versão sobre o ocorrido em detalhes. E, por mais uma vez, pediu perdão aos parentes de Eloá, principalmente à ex-sogra Ana Cristina Pimentel, a quem se referia como Tina. Para ele, se há alguma vítima no trágico desfecho do caso são os parentes. "Causei grande dor a eles. Estou pagando por algo que fiz. Tenho forte ligação com eles."
Ana Cristina e seus dois filhos compareceram ao júri - ela, mais uma vez, de vestido preto. Mas o perdão pedido por ele não veio. "Esperamos apenas que venha a condenação. Não tem outro resultado", disse o irmão mais velho de Eloá, Ronickson Pimentel dos Santos. Mais calma, durante o testemunho, a mãe discordou várias vezes com o balançar da cabeça.
Uma das irmãs de Lindemberg compareceu no plenário pelo terceiro dia. Fugiu das entrevistas e não demonstrou reação durante a fala do irmão. Um amigo que a acompanhava balançava a cabeça positivamente a toda declaração do acusado.
Lindemberg citou mais de uma vez o irmão mais novo de Eloá, Everton Douglas Pimentel, com quem disse ter forte laço de amizade e era a quem pedia para falar no telefone durante as negociações com a polícia. "Eu gosto muito desse moleque. Não tenho nada contra. Pelo contrário, tenho uma dívida muito grande com ele pela perda da irmã." Segundo o réu, o garoto foi poupado de ficar no cativeiro pelo forte vínculo entre os dois.

Destino de Lindemberg será decidido hoje em Sto. André

O destino de Lindemberg Alves Fernandes deve ser anunciado hoje. Após o término dos depoimentos das 14 testemunhas, resta apenas o debate entre promotoria e defesa para que os sete jurados revelem sua decisão. Caso condenado, a juíza Milena Dias determinará a pena que ele terá de cumprir.
O inédito testemunho de Lindemberg, ontem, foi elogiado pelo especialista em Direito Penal Luiz Flávio Gomes. "Foi uma das melhores autodefesas que já vi." A juíza Milena Dias advertiu para as contradições de sua fala. E a acusação criticou: "Foi irônico", disse José Beraldo, assistente da acusação.
A demora pode ter ajudado Lindemberg. Disse que comprou o revólver calibre 32 por R$ 700 de um senhor para se proteger de ameaças que vinha recebendo.
Em sua versão, ele e Eloá haviam se separado um mês antes do ocorrido. Aos pais, a menina disse que ele tinha lhe batido. Ele diz que nunca encostou a mão na ex-namorada. "No apartamento ela gritava como se estivesse apanhando. Mas não teve isso."
Ambos haviam reatado uma semana antes do ocorrido. No primeiro dia do caso, Lindemberg diz que foi visitar a ex e se surpreendeu ao vê-la no apartamento com a amiga Nayara Rodrigues e os garotos Iago Oliveira e Victor Campos, com quem diz ter descoberto que Eloá teve um caso. "Qualquer pessoa por estar armada ia tomar uma medida mais extrema."
Lindemberg diz que sacou a arma para cobrar explicações da amada. Foi quando apareceu o pai de um dos garotos. Com a porta trancada e informado de que ele estava armado, chamou a polícia. "Precisei de um tempo para assimilar aquele monte de policiais que apareceu."
O réu admite ter mantido apenas Eloá como refém. Diz que os outros três jovens podiam sair quando quisessem, mas que queriam fazer companhia à amiga. Os meninos passaram mal e saíram.
Segundo ele, por algum tempo os três levaram "na brincadeira" o que estava acontecendo. Ele diz que Eloá dizia estar com medo de que o desfecho da história fosse igual ao sequestro de um ônibus no Rio de Janeiro, onde a refém morreu. A ideia de falar com a imprensa teria sido de Nayara. "A polícia chegou a mexer na maçaneta da porta enquanto estávamos cochilando. Não confiei neles."
Lindemberg admite ter disparado dois tiros, um na tela do computador e outro no chão do prédio. Mantém a versão de que não alvejou Nayara. E disse não se lembrar de quantas vezes acertou Eloá.
Confessou apenas o cárcere privado da ex. E chamou de "ficção" a tentativa de homicídio do sargento da Polícia Militar Atos Valeriano. "Não tive contato visual com nenhum PM." Sobre as ameaças feitas ao telefone, disse que era blefe para "que eles saíssem do local."
Primeiro a testemunhar ontem, o tenente do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) na época, Paulo Squiavo, disse ter ouvido o contrário no apartamento vizinho que ocupou no dia da invasão. "Em todo o momento ele ameaçou a vida da menina. Era sua intenção matá-la."

Promotora mostra arma do crime ao réu

Por cerca de uma hora e meia, Lindemberg Alves, 25 anos, foi sabatinado pela promotora de Justiça Daniela Hashimoto. Entre os questionamentos, desde onde conheceu Eloá Cristina Pimentel até o manuseio no revólver calibre 32, arma que matou a ex-namorada.
"Faz tempo que o senhor não a tem em mãos", afirmou a promotora, antes de dirigir-se ao réu, sentado na cadeira dos depoentes pela primeira vez. "O senhor reconhece essa arma?", indagou, depois de retirá-la de um saco plástico. "Se não for essa, é parecidíssima", apontou ele.
Ainda não satisfeita, a promotora questionou o fato de Lindemberg prever ações da polícia, mesmo sendo réu primário. "Não vamos ser ingênuos, doutora, a abordagem onde moro é diferente de onde a senhora mora", rebateu, com aspereza. Visivelmente irritada, a promotora respondeu: "Espero que o senhor não saiba mesmo onde eu moro."
Ao longo das indagações, a promotora tentou provocar a contradição do réu, que se mostrou firme em vários momentos do depoimento. Mas Lindemberg não conseguiu convencer a promotora de acusação em vários pontos.
Um deles foi o fato de o réu ter dito que os três colegas de Eloá, reféns no apartamento, poderiam sair a qualquer momento. "A porta estava aberta no momento em que eu entrei, depois fechei", contou. E Daniela o questionou: "E a chave?" Lindemberg respondeu secamente: "Ficou comigo".
Para o assistente de acusação, o advogado José Beraldo, Lindemberg foi irônico. "Pretendo mostrar amanhã (hoje) que o réu mentiu. Sem falar que não há sentimento de dor ou de perda", afirmou, logo após o encerramento dos trabalhos.
Ana Lúcia Assad, advogada de defesa do réu, no entanto, obviamente, foi mais leve. Entre os parcos questionamentos, indagou se seu cliente, em algum momento, desejou a morte de Eloá. A resposta curta e seca de Lindemberg: "Nunca". Antes, havia confessado que atirou na ex-namorada.
Calor no plenário obriga juíza a retirar a tradicional toga
Não só os extensos depoimentos de testemunhas de defesa e de acusação, além do primeiro e único testemunho de Lindemberg Alves feito à Justiça, ontem, movimentaram o plenário do Tribunal do Júri nos últimos três dias. Mas também o forte calor no local. Sem ar-condicionado e não mais do que 15 ventiladores (alguns de teto), a própria juíza Milena Dias teve de abrir mão da tradicional toga no período da tarde.
Antes do depoimento do réu, a magistrada agradeceu a preocupação de algumas pessoas pelo seu estado físico e pediu permissão para o não uso da toga. "Realmente está muito quente. Apenas por isso", afirmou.
Até anteontem, os ventiladores móveis não estavam disponíveis na plateia, equívoco corrigido ontem pela assessoria do Fórum de Santo André.

Calmaria

Um dia depois de a advogada de Lindemberg, Ana Lúcia Assad, ter se desentendido com a juíza, durante o trabalho em plenário, ontem, o clima, apesar do insuportável calor, ficou mais ameno.
Na terça-feira, Ana Lúcia se sentiu ameçada por hostilidades de populares e pediu ajuda à OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Santo André. "Solicitamos que não confundam o papel da advogada, que está cumprindo sua função constitucional, com a pessoa que está sendo julgada", disse Fábio Picarelli, presidente da OAB no município.
Antes de ser preso, Lindemberg era um jovem de periferia que trabalhava, gostava de praticar esportes, curtia baladas e namorava. Encarcerado, o rapaz /CL/CP/IPainda mantém alguns hábitos antigos.
O réu relatou como é o cotidiano dentro da penitenciária onde vive há três anos e quatro meses. "Acordo às 5h, tomo café e vou trabalhar. Tem o banho de sol dia sim, outro não", disse ao júri.
O futebol, que lhe rendeu o apelido de Liso por conta dos dribles e habilidade, só é liberado aos fins de semana. Lindemberg afirmou que, antes, jogava bola três vezes por semana nos campos do Jardim Santo André,
Sobre alimentação, o réu disse receber cardápio padrão com arroz, feijão e mistura variada. "Às vezes tem carne."
Declarando estar arrependido dos erros que cometeu, Lindemberg disse se apoiar na fé nos dias que tem passado dentro da prisão. "Deus está me dando força", afirmou o réu, que, ontem, usava camisa de uma banda gospel. Ele ainda relatou que estuda a Bíblia na penitenciária.

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