segunda-feira, 30 de julho de 2012


"Enfrentamos dificuldades para encontrar frutas no RN"


Enquanto várias empresas engavetam projetos, com receio dos efeitos da crise mundial, o Grupo General Brands (formado através de uma recente fusão entre General Brands e Nutrimarcas) formaliza a intenção de investir R$ 30 milhões no Rio Grande do Norte. O recurso está sendo aplicado numa unidade de envase, em Mossoró, que transformará polpas em sucos prontos para beber, refresco em pó e gelatina. "O melhor momento para vender guarda-chuva é quando está chovendo e dando trovoada", afirma José Domingues dos Santos, sócio presidente do grupo e fundador da ICP Fazenda Maísa, mostrando que há oportunidade mesmo em tempos de crises. Com o investimento, a capacidade da indústria sobe para 72 mil toneladas por ano. Enquanto o Rio Grande do Norte não consegue suprir a demanda da fábrica, que exportará parte da produção, o grupo compra frutas em estados vizinhos. Embora outros estados tenham parecido mais atrativos à primeira vista, a General Brands, uma das maiores empresas de sucos e alimentos do Brasil, acabou optando por investir no RN. Entre os estados sondados, estavam Sergipe, Paraíba e Bahia. Nesta entrevista, Talita Santos, Relações Públicas da Nutrimarcas, José Domingues dos Santos e Isael Pinto, sócios presidentes do Grupo General Brands e Neiva dos Santos, sócia presidente da Nutrimarcas, explicam por que escolheram o estado e mostram que ainda há obstáculos a serem vencidos.
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O cenário é de desaceleração na indústria e na agropecuária. Por que o Grupo General Brands decidiu investir agora?

Isael Pinto: A General Brands estava para instalar uma unidade do Nordeste. Encontramos oportunidades nos estados da Bahia,  Sergipe e Alagoas, onde quase instalamos uma unidade na cidade de Rio Largo, numa área de 200 mil metros quadrados. Daqui, poderíamos atender os nove estados nordestinos e abraçar milhões de consumidores das regiões Norte e Nordeste. A nossa intenção era essa. Aumentar o faturamento e repassar o produto para o consumidor final a um preço mais competitivo. Como tenho uma amizade antiga com Domingues, no tempo da Gtex, decidi trazer os equipamentos para o Rio Grande do Norte. A ICP Fazenda Maísa foi a responsável por nossa vinda. Como a fábrica já fornecia polpa de frutas para a General Brands, pensamos em unir as duas empresas. Aceleramos essas negociações e encontramos uma forma mais favorável para exportar. Foram  avaliadas todas as possibilidades de sucesso. Vamos atender não só os 75 milhões de consumidores do Nordeste e do Norte, como também os 190  milhões de todo o Brasil e até os do exterior. 

O fato de contar com uma fábrica de polpas em operação no RN foi fundamental para a fusão e o aporte de capital no Estado. Além desse fator, há outros que tenham justificado esse aporte?

Domingues: A logística. Praticamente 30% do que a General Brands produzia no Sudeste era vendido no Nordeste. Nada melhor que pegar a polpa de fruta, que é produzida aqui no RN, e transformar em suco pronto para beber, fechando o ciclo, aqui no estado. 

O que faz o grupo General Brands anunciar investimentos quando a maioria das empresas engaveta projetos eo cenário da indústria nacional não parece favorável?

Domingues: O cenário da indústria não é mesmo favorável. Mas eu diria que  o melhor momento para vender guarda-chuva é quando  começa a chover e dar trovoadas. Se todo mundo está chorando, venda lenços.  Acredito que se trata de um grande momento. A força por trás do consumo de bebidas saudáveis continua aumentando. Temos aqui um celeiro de frutas. Precisamos só transformar isso em sucos prontos para beber, refrescos, gelatina, chiclete e mais produtos que devem vir. 

Luiz Barcelos, diretor da Agrícola Famosa, maior exportadora de frutas frescas do país com produção no Rio Grande do Norte, Ceará e Pernambuco, criticou a falta de estrutura para escoar a produção no estado. A ICP Fazenda Maísa também enfrenta dificuldades para escoar?

Talita: Por estar perto do Porto de Natal e Pecém, a ICP Fazenda Maísa não tem enfrentado dificuldades para escoar a produção. 

Segundo sondagem da indústria, divulgada pela Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte, a confiança do setor está em baixa. O mesmo não ocorre com o grupo General Brands, não é isso?

Isael: Pensemos um pouco no crédito imobiliário. O Brasil não tem hoje nem 7%, 8% de crédito imobiliário. Os EUA tem 90%. Tem muita oportunidade de crescimento dentro deste país. Vem aí uma Copa do Mundo. Vem aí as Olimpíadas. Os estados nordestinos, que recebem grande parte dos turistas estrangeiros, tem uma grande população flutuante. Temos que observar isso. Os europeus que descobriram o Nordeste são os europeus pobres. Não foram os ricos. Os ricos vão para Sardenha, Ilhas Gregas. Imagina quando eles descobrirem o Nordeste também. Vamos sim gerar muitos empregos aqui e mandar os nossos produtos para o mundo.

Para onde exportam?

Isael: Os produtos da GB já chegaram a ser exportados para 26 países, quando o câmbio era favorável, e permitia este tipo de operação. Exportávamos para países como Venezuela, Uruguai, Angola, Portugal, Japão. Até para o Oriente Médio. Nesta época, o dólar variava entre R$ 2,40/ R$ 2,60. Hoje, exportamos sucos prontos para cinco, seis países. O câmbio está na faixa dos R$ 2. Já está sendo possível retomar a exportação em alguns outros países. Se baixar mais, fica complicado para qualquer indústria, não só a nossa. O industrial não tem como intervir no câmbio. 

Talita: hoje, o mercado está muito mais propício à exportação em virtude do aumento do dólar. A empresa, a ICP Fazenda Maísa, tem  dois anos, e já exporta para países da Europa - como Suíça, Alemanha, Holanda, e também para o Japão e EUA. Também estamos prospectando novos mercados, na África, na América do Norte.

Luiz Barcelos, da Agrícola Famosa, em entrevista recente concedida à TRIBUNA DO NORTE, se mostrou reticente quanto as exportações em 2012. Como vocês avaliam o cenário para a exportação?

Talita: o europeu continua consumindo.

Domingues: As frutas tropicais tem mercado garantido. 

Isael: Tanto no mercado externo quanto no interno. Acredito que a exportação de uma indústria - como marca própria - jamais deve ultrapassar 12% do total produzido.  Se não tiver uma boa distribuição no mercado interno, você se complica. Seu mercado interno é sua prioridade. E a exportação complementa. Se você exportar até 15% da tua produção fará um excelente negócio.

Com o investimento recém-anunciado de R$ 30 milhões, a capacidade da ICP sobe para 72 mil toneladas por ano. O que falta para a Fazenda aumentar a produção e atingir a capacidade máxima?

Domingues: enfrentamos dificuldades para encontrar frutas no Rio Grande do Norte. Temos que buscar frutas no Piauí, no Ceará, na Bahia. Todas frutas que poderiam ser produzidas aqui. Mas o que fez a General Brands se unir à Nutrimarcas e formar o Grupo General Brands? O fato da governadora do estado ter visitado a nossa indústria, em Guarulhos, e nos convidado a ampliar a nossa fábrica no estado. Este contato fez com que decidíssemos investir R$ 30 milhões em equipamentos e trazer máquinas para envasar sucos e produzir refrescos, gelatina, chicletes no Rio Grande do Norte. Isso não terá tanto efeito se os 12 mil hectares sem produção próximos à fábrica não voltarem a produzir. O trabalho, junto ao Município de Mossoró e ao Estado do Rio Grande do Norte, é fortalecer os assentados. Vamos passar aos assentados uma relação de frutas que o mercado está pedindo. Vamos orientá-los. Vamos dizer que frutas precisamos e em que quantidade para não sobrar frutas e faltar comprador.

Qual a proporção de fruta comprada no RN e em outros Estados?

Talita: 70% das frutas que beneficiamos são compradas fora do estado, em estados como Ceará (30%), Pernambuco, Paraíba, Piauí. Não há muita variedade no Rio Grande do Norte. Quem produz fruta no estado pode  procurar a fábrica e oferecer o produto.

Neiva: compramos só no Nordeste, região que sempre teve muito potencial, mas que está sendo vista pelos empresários só agora.

Mas o Nordeste, no entanto, está enfrentando a pior seca dos últimos 50 anos. Isso não atrapalha os planos da empresa?

Isael: Vai faltar alimentos nos EUA com a seca no Arizona. Imagina o que vamos ter de oportunidade. Vamos tentar ampliar a irrigação para exportar para lá. Seca vai haver sempre. O mundo todo atravessa suas dificuldades, que eu chamo de desafios. Essa seca do Nordeste realmente é muito severa. Vamos ver o que podemos fazer. Tem que haver uma união entre governo federal, governo estaduais, banqueiros e povo. Qualquer país  que conseguir isso superará tudo. 

Neiva: No RN, o governo estadual poderá nos ajudar recuperando os poços.

A necessidade de se recuperar os poços foi colocada para o Governo?

Neiva: Foi sim. O Governo disse que nos ajudará.

Talita: O secretário de Recursos Hídricos do estado, Gilberto Jales, foi um dos que assinaram o protocolo de intenções por parte do governo, se comprometendo a nos ajudar com relação aos poços artesianos.
Domingues: Há quinze anos, a antiga Maísa já irrigava essa região.

Talita: o que precisamos é que o governo recupere os poços e deixe a disposição dos assentados. Também é preciso garantir crédito para instalarem equipamentos nas terras. Isso vai salvar o Nordeste. O Nordeste tem água, mas ela está muito profunda. Precisamos tirá-la para irrigar a região e não sofrer com a falta de frutas.

O que a ICP fará se não houver frutas em quantidade suficiente? Tem um plano B?

Isael: Nós temos muita fé. Acreditamos que vai chegar água já já e vai resolver esse problema. 

Mas esse é o plano B? Isso pode demorar muito...

Nós temos que confiar.  Nós não vamos ter esse tipo de problema no Rio Grande do Norte. Certeza absoluta. Pensamos muito antes de tomar essa decisão. Domingues podia continuar produzindo polpa de frutas aqui e a gente poderia ter instalado a nossa unidade fabril (General Brands) em outro estado. Vocês verão nos próximos anos que nós estávamos certo. Se faltar água e fruta, podemos aumentar a produção de chiclete, chocolate, gelatina, que não precisam de muita água e fruta. Temos que ser versáteis. Temos um plano C também se precisarmos.

Talita: é importante lembrar que hoje na região já existem produtores que tem poços artesianos e irrigam sua plantação. Não acreditamos que faltará fruta mesmo que a recuperação dos outros poços demore um pouco. Temos frutas. Compramos nos outros estados, mas queremos comprar mais no RN do que nos outros estados. Queremos que o RN se prepare para isso. Se não, vamos continuar comprando, mas do Ceará, do Piauí, de Pernambuco e de outras regiões.
    
Estão dispostos a comprar toda a produção da região?

Domingues: Sim, vamos comprar 100%. Esse é o nosso compromisso. Comprar toda a produção dos assentados daquela região.

Talita: O protocolo assinado esta semana oficializa isso. O governo vai nos incentivar e a fábrica vai estimular o plantio através da garantia de compra. Não adianta os assentados produzirem e não terem para quem vender. 

Esses produtores serão qualificados?

Talita: Vamos qualificá-los junto com universidades como Ufersa e Uern e entidades como Sebrae e Coex. 

Neiva: Nosso objetivo é gerar 500 empregos diretos na fábrica e cerca de 2 mil no campo, e 10 mil indiretos. É um projeto muito grande do grupo, que atende todo o país.

Isael: aqui no Rio Grande do Norte, não há nenhuma fábrica que produza sucos prontos para beber.

Por  falar em fábricas do ramo, a governadora está isentando as frutas produzidas e comercializadas dentro do Estado, a pedido da ICP Fazenda Maísa. Como foi a negociação? Ela abre caminho para outras indústrias?

Isael: Sem dúvida. Essa medida faz com que novas indústrias venham aqui para o Rio Grande do Norte. 

Talita: não só indústrias do setor, mas de outros ramos também, atraídas pelo aumento da renda da população local.

Qual o impacto prático dessa medida?

Talita: Não temos esse cálculo ainda. Mas é isenção que nos leva a comprar produção nos 12 mil  hectares ao redor da fábrica. Nossa produção triplicará. Essa medida permitirá reinvestirmos na nossa empresa para prepará-la para isso.

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